Você já ouviu falar desses eventos conhecidos como “jams” de tradução? A proposta por trás desses eventos é proporcionar aos tradutores a oportunidade de participar da tradução de um projeto completo, normalmente traduzindo um produto que está pronto (ou quase pronto) para ser lançado no mercado — e sem custo algum para os participantes. É também uma forma de adquirir experiência e, se a tradução for considerada de boa qualidade, colocá-la em seu portfólio.

Gostou da ideia? Vamos conhecer um pouco mais sobre esses eventos e como eles podem ajudar a dar aquele empurrãozinho na nossa carreira?

As origens do nome

O termo “Jam” vem originalmente de jam session, uma prática que começou com grupos de jazz e que depois se espalhou por outros estilos musicais. Nos bares conhecidos como speakeasies, ainda na primeira metade do século XX, surgiu uma tradição: depois que a principal atração musical da casa já havia tocado, os músicos que estavam presentes (ou que chegavam ao local após terminar suas próprias apresentações em outros estabelecimentos) subiam ao palco para tocar de acordo com as ideias que surgissem na cabeça, improvisando as escalas e harmonias conforme a música se desenvolvia. Esses eventos foram ficando cada vez mais populares e ganharam o nome de jam sessions.

Ou seja: “jam”, neste contexto, não tem nada a ver com a tradução
para o inglês da palavra “geleia”

A influência dos games

Já no século XXI, uma área que abraçou o conceito das jam sessions foi a criação e desenvolvimento de jogos para computador — as chamadas Game Jams. De acordo com o site Educação Na Prática, “o termo se refere a encontros – que podem ser presenciais ou online – em que desenvolvedores trabalham em conjunto para propor protótipos ou conceitos experimentais para novos jogos. (…) O objetivo é reunir ideias e desenvolver projetos em um curto espaço de tempo. Nas jams, esse período costuma variar entre 24 e 72 horas. Os participantes se dividem em times que costumam variar entre 4 e 6 pessoas, que costumam ser designers, programadores, desenvolvedores e outros profissionais que atuam na área. O tema para todo o evento é revelado pouco antes do início da sessão, para evitar que alguém venha com ideias prontas ou possua algum tipo de vantagem.”

LocJAM: A primeira Jam de tradução

Em 2014, a International Game Developers Association (IGDA) promoveu a primeira de 4 jams focadas exclusivamente na tradução de jogos. O formato era bem parecido com as Game Jams: os tradutores (sozinhos ou em pequenas equipes) recebiam um game para localizar em um período de poucos dias — o prazo curto serviria para simular a pressão e o estresse de um projeto de localização, também.

A primeira Jam a gente nunca esquece!

O jogo foi promovido pela IGDA de 2014 a 2017. Após um hiato de alguns anos e ajustes no formato, o idealizador da LocJAM, Alain Dellepiane, passou a promover o evento por conta própria e fora do formato de competição que marcou as primeiras edições.

Jams de tradução genuinamente brasileiras

Aqui no Brasil, a Translators101 oferece jams de tradução para os seus assinantes premium. A cada ano são oferecidas jams em três áreas da tradução:

  • SubJam, com foco em legendagem.
  • BoardgameJam, com o foco na localização de um jogo de tabuleiro.
  • LitJam, para a tradução de literatura.

As jams oferecidas pela Translators101 seguem o formato das primeiras LocJAMs da IGDA, consistindo em concursos com premiações para os três melhores trabalhos e o  reconhecimento de participantes com menções honrosas. E o diferencial é que os jurados dessas jams são tradutores reconhecidos e gabaritados em suas áreas de atuação — o que faz com a premiação ou menção honrosa nesses eventos dê um belo peso ao currículo dos tradutores!

E para demonstrar melhor alguns dos benefícios de participar de eventos como estes, nós conversamos com alguns dos jurados que já avaliaram os trabalhos dos participantes nas jams promovidas pela Translators101:

  • Dafne Baddini e Deborah Cornélio, juradas do SubJam
  • Cláudia Mello Belhassof, jurada do LitJam
  • Luciana Galeani Boldorini e Ivar P. Junior, jurados do BoardgameJam

Confira!

1.) Por que participar de uma Jam de tradução e qual é a importância desse tipo de evento para o tradutor?

Cláudia: O tradutor que participa do LitJam tem visibilidade, além de ganhar prêmios ou ter sua tradução publicada. Pode ser uma excelente porta de entrada para a tradução editorial.

Dafne e Deborah: O SubJam é uma excelente oportunidade para tradutores que queiram se desafiar na legendagem, uma modalidade tradutória com demanda crescente no mercado. A possibilidade de figurar entre os primeiros lugares, ou mesmo de receber uma menção honrosa, é uma chancela bem-vinda ao currículo daqueles que ainda não têm experiência, já que o corpo de jurados é formado por profissionais gabaritadas que sabem identificar um ótimo trabalho segundo as preferências do mercado.

Aqui não tem moleza na avaliação, não!

Vale lembrar, ainda, que o tradutor é uma persona virtual, que se relaciona pela Internet com seus colegas a maior parte do tempo. Por isso, um concurso como esse, de âmbito nacional, oferece a possibilidade de o participante entrar em contato com seus pares, conhecer futuros colegas ou profissionais que atuam na área e, a partir daí, fazer um networking bacana.

Luciana e Ivar: O BoardgameJam dá aos participantes a oportunidade de trabalhar com um projeto de localização de um jogo de tabuleiro em condições bem parecidas àquelas que seriam encontradas em um projeto do “mundo real”. Como essa área da tradução ainda é um nicho e há poucos estúdios especializados na publicação de jogos de tabuleiro no Brasil (embora esse número venha crescendo aos poucos), uma competição como o BoardgameJam é uma excelente oportunidade para conhecer melhor o processo e as particularidades desse tipo de projeto.

2.) Quais são as características do trabalho escolhido para a Jam?

Dafne e Deborah: Primeiramente, em respeito à lei de direitos autorais, o vídeo deve ser de domínio público. Além disso, é importante que seja uma obra audiovisual de ficção que dure entre 10 e 20 minutos. Assim, não fica longo e cansativo demais para os participantes, nem curto a ponto de não desenvolver bem o enredo e os personagens. Por último, o vídeo precisa ser desafiador do ponto de vista técnico e tradutório, para que o participante possa mostrar todo o seu potencial criativo e rigor em relação às normas técnicas de legendagem.

Luciana e Ivar: Escolhemos jogos de tabuleiro que tenham sido disponibilizados gratuitamente pelos seus autores, com cerca de 3.000 palavras a traduzir no total; procuramos buscar também jogos que estejam completos e que tenham uma boa variedade de componentes, como o manual do jogo, o tabuleiro, cartas e outros; tentamos dosar a quantidade de trabalho proposta na Jam com a carga de trabalho que os tradutores já têm que enfrentar na “vida real”. E procuramos também jogos que tenham um nível de complexidade razoável em termos de desafios de tradução, considerando que as Jams promovidas pela Translators101 premiam os melhores trabalhos.

3.) O que é avaliado na Jam?

Ivar e Luciana: Avaliar um trabalho de localização nem sempre é uma tarefa simples, pois os tradutores têm uma certa liberdade na hora de adaptar termos ou trechos para o público consumidor brasileiro; mesmo assim, há certas adaptações que simplesmente não são aceitáveis porque se afastam demais do texto original ou porque ficam sem sentido para um leitor brasileiro, especialmente em jogos direcionados a faixas etárias mais jovens. 

Outra área à qual prestamos bem atenção é na tradução das regras do jogo, que seria a parte mais “técnica” de uma tradução de boardgames. A tradução errada de uma regra, ou mesmo a falta de atenção no uso de números (trocar “+1” por “+11”, por exemplo), são coisas que o corretor ortográfico da ferramenta geralmente não detecta e que pode “quebrar” o jogo, prejudicando bastante a experiência dos jogadores.

Cláudia: Fluidez; fidelidade ao original (não fidelidade absoluta, mas usar os termos corretos); ortografia (quem não passa o corretor automático é automaticamente desclassificado); naturalidade do texto; regras de pontuação, principalmente a pontuação dos diálogos; e manter o registro do autor (formal ou informal). 

Dafne e Deborah: As traduções para o SubJam são avaliadas tal como numa situação real de trabalho, considerando critérios adotados por grandes produtoras do audiovisual. São eles: qualidade e naturalidade da tradução, boa redação e clareza na escrita, respeito às regras gramaticais, poder de síntese e boa relação de caracteres por segundo, além de uma sincronização competente. Além disso, observamos também se o tradutor se atentou às questões de estilo e padrão técnico indicadas nas instruções.

Cabe ressaltar que os padrões técnicos e estilísticos são os mesmos da Netflix, o que acaba aproximando os candidatos da realidade do mercado. Recebemos muitos futuros colegas que legendam de forma amadora para sites de fãs, e poder ter contato com os padrões profissionais exigidos pelo mercado é uma ótima forma de aprendizado também.

Referências:

Vídeos com os feedbacks das jams mais recentes:

Nossos entrevistados: 

Claudia Mello Belhassoff: 

Dafne Baddini;

Deborah Cornélio:

Luciana Galeani Boldorini:

Ivar P. Junior:

Outras referências:

— Ivar Jr e Luciana Boldorini, Rook tradução.

Para saber mais sobre diversas perguntas que recebemos sobre as áreas de tradução, interpretação e revisão, leia este post.

Deixe um comentário

plugins premium WordPress